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Le Cocq gerou o Esquadrão da Morte e ‘parcerias’ com os bicheiros do Rio

Grupo de extermínio de bandidos surgiu em 1965 com doze policiais que matavam ‘chupando pirulito’, entre eles Mariscott, assassinado pelo bicho

 

    • Eduardo Marini, do R
MMM(centro): crimes e conquistas

MMM(centro): crimes e conquistas

Estadão Conteúdo

Esquadrão da morte, por definição, é um grupo paramilitar armado formado por policiais, terroristas ou civis para executar ações extrajudiciais, ilegalidades, crimes e assassinatos, a mando de grupos políticos ou líderes da sociedade. Na maior parte dos casos, essas atividades são realizadas sob sigilo, para evitar a revelação de identidades e punição dos agentes.

No Brasil, os esquadrões da morte começaram a pipocar em vários estados nos anos 1960. O mais notório – e cruel – deles surgiu em 1965, no Rio de Janeiro do então Estado da Guanabara, a partir da Scuderie Le Cocq, ou Esquadrão Le Cocq. E tomou corpo com o apoio extraoficial do governador do estado na época, o mineiro Francisco Negrão de Lima (em 15 de março de 1975 houve a fusão dos estados da Guanabara e do Rio de Janeiro).

O núcleo duro da Scuderie Le Cocq era composto pelos chamados Doze Homens de Ouro da Polícia fluminense, um para cada signo do zodíaco, escolhidos a dedo pelo então secretário de Segurança do Rio, Luis França, para “promover uma faxina”, ou seja, tirar de cena ladrões de carros, táxis e casa, assassinos, assaltantes e afins.

A escalação do time: Aníbal Beckman dos Santos, o Cartola, Euclides Nascimento Marinho, Hélio Guahyba Nunes, Humberto de Matos, Jaime de Lima, Lincoln Monteiro, Mariel Mariscot de Matos, Nelson Duart, Neils Kaufman, o Diabo Loiro, José Guilherme Godinho, o Sivuca, Vigmar Ribeiro e Elinto Pires.

Oficialmente, a Scuderie foi montada para promover a vingança do assassinato, em ação, de Milton Le Cocq, primo do brigadeiro Eduardo Gomes e respeitado detetive que havia integrado a guarda pessoal de Getúlio Vargas. Le Cocq foi abatido a tiros por Manoel Moreira, o Cara de Cavalo, bandido que comandava o esquema de proteção às bancas, banqueiros, funcionários e pontos do jogo do bicho na Favela do Esqueleto.

Cara de Cavalo caiu na rede da Scuderie poucos dias depois de matar Le Cocq. Foi fuzilado com 52 tiros, “o primeiro para matar, o segundo para confirmar e o terceiro para fazer a festa”, como disseram colaboradores na ocasião. Um dos líderes da operação foi José Guilherme Godinho Ferreira, o Delegado Sivuca, que mais tarde, em 1990 e 1994, seria eleito deputado estadual no Rio com o sugestivo e explícito bordão bandido bom é bandido morto. “A Scuderie foi criada para dar satisfação à sociedade”, costumava discursar Sivuca. “Havia uma regra: criminoso que reagisse à prisão era chão. Morto sem a menor dúvida.”

Na prática, a turma matava chupando pirulito – e Cara de Cavalo foi só o tiro de largada da prova. Depois dele, vários ícones da bandidagem carioca da década de 1960 foram para o latão com centenas de comparsas. Entre eles Mineirinho, Zé Pretinho (fuzilado na porta de seu barraco no Morro dos Macacos, no bairro de Vila Isabel, zona norte da cidade), Bidá (abatido no Morro do Querosene, no Catumbi) e Passo Errado (que teve os passos interrompidos para sempre no Morro do Tuiuti, em São Cristóvão).

A Scuderie tinha como presidente executivo Euclides Nascimento. E de honra o jornalista David Nasser, dos Diários Associados. O emblema trazia uma caveira sobre ossos cruzados, e o significado original das iniciais EM no brasão é Esquadrão Motorizado, divisão da polícia carioca da qual Milton Le Cocq fazia parte, e não Esquadrão da Morte, mas essa informação era solenemente desprezada pelos populares e até mesmo por integrantes.

EM do símbolo da Le Cocq é de Esquadrão Motorizado, e não da Morte, como muitos pensam
EM do símbolo da Le Cocq é de Esquadrão Motorizado, e não da Morte, como muitos pensam

Divulgação/Youtube

A Le Cocq transformou-se em associação e, no auge, chegou a ter mais de sete mil seguidores, entre associados e admiradores. Com o tempo e o aumento assustador dos índices de vaidade e de poder gerado pelo medo, seus integrantes assumiram projetos mais ambiciosos – e perigosos -, entre eles as parcerias com líderes do jogo do bicho. Muitos lecocquianos ligavam para imprensa para contar em detalhes como tinham acabado de fechar um ou um grupo de criminosos. Para combater essas e outras práticas, consideradas excessos internamente, a Scuderie expulsou alguns de seus pesos pesados.

O mais famoso desses líderes dispensados foi o policial mais famoso de sua geração: Mariel Araújo Mariscot de Mattos, o Mariel Mariscot, o Ringo de Copacabana, ou MMM, limado da Scuderie na década de 1970. Mariscot nasceu em Niterói mas, por mais um desses caprichos do destino, foi criado na mesma Bangu do megabanqueiro de bicho Castor de Andrade (leia reportagem sobre ele nesta série). Treinava natação e pólo-aquático no Bangu Atlético Clube e foi campeão carioca de natação e saltos ornamentais.

Como policial, MMM passou o rodo em alguém pela primeira vez ainda jovem, em Copacabana, durante um flagrante de assalto em que o ladrão resistiu à voz de prisão. Ameaçado de prisão por homicídio, rendeu o delegado do caso com duas pistolas calibre 45, uma em cada mão. Surgia o apelido Ringo de Copacabana.

Bonito e forte, conquistou algumas das mulheres mais desejadas do Rio de Janeiro em sua época, entre elas as atrizes Elza de Castro e Darlene Glória, além da modelo Rose di Primo. Nos anos 1960, teve um caso com Rogéria, a “travesti da família brasileira”.

Mariscot foi detido sob acusação de assassinato e de integrar o Esquadrão da morte. Em 19 de junho de 1973, recebeu pena de 16 anos e dez meses de reclusão. Fugiu da cadeia, mas depois foi obrigado a passar um período no presídio de Ilha Grande.

De volta às ruas, decidiu tentar, a todo custo, fazer parte do poderoso grupo do jogo do bicho – o problema é que esqueceu de combinar com o baronato da atividade. MMM e sua intenção tombaram juntos depois de uma sequência de balas disparadas contra o ex-policial no dia 8 de outubro de 1981, no Centro do Rio, em frente a uma das fortalezas do bicheiro Raul Capitão, no centro do Rio. Tinha 41 anos.

Mariscot era sócio de um dos filhos de Capitão, Marcos Aurélio Corrêa de Mello, o Marquinhos. É provável que tenha deixado no parceiro a semente de sua ambição desmedida: sete anos depois, em maio de 1988, Marquinhos também tombou em solo carioca a tiros de metralhadora.

Extinta no início de 200, a Scuderie voltou em 2015 em versão bem mais discreta, “do bem” e com novo nome: Associação Filantrópica Scuderie Detetive Le Cocq. Entre seus 60 integrantes estão policiais aposentados e profissionais de outras áreas. O objetivo agora é fazer um “trabalho preventivo e de conscientização” dos cariocas diante da violência que afeta a cidade.

“Queremos colaborar com as autoridades e mudar a imagem que tivemos no passado”, disse o presidente da associação, o policial civil aposentado Humberto Fittipaldi Filho, durante uma panfletagem na Lagoa Rodrigo de Freitas, zona sul da Cidade Maravilhosa. Os Doze Homens de Ouro certamente achariam um fim melancólico, mas até a melancolia pode ter alguma versão positiva.

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Ex-Cabo Bruno sai da cadeia após 27 anos para fazer a obra de Deus: ‘Sou pastor evangélico’

 

"Deus me preparou nesses 20 anos exatamente para isso"

Por Amanda Gigliotti | Repórter do The Christian Post

O ex-PM Florisvaldo de Oliveira, condenado a 117 anos de prisão e com mais de 50 assassinatos, saiu da penitenciária na tarde desta quinta-feira, e afirmou que vai fazer a “obra de Deus” de agora em diante, segundo relatou a Folha de S.P.

  • Florisvaldo de Oliveira

    (Foto: Divulgação)

    Ex-PM Florisvaldo de Oliveira, cabo Bruno, saiu da cadeia nesta quinta-feira,23 de agosto de 2012, após 27 anos de prisão.

"Sou pastor evangélico. Minha família é evangélica. Deus me preparou nesses 20 anos exatamente para isso", disse ele à publicação.

Bruno pretende virar pastor e atuar ao lado de sua esposa, a também pastora evangélica e cantora gospel, Dayse da Silva Oliveira. Dayse está no momento afastada das reuniões de sua igreja, a Igreja Pentecostal Refúgio em Cristo, na vizinha Taubaté, para evitar o assédio da imprensa e curiosos.

Bruno foi acusado de cometer o homicídio de mais de 50 pessoas na zona sul de São Paulo, nos anos 1980. Ele conseguiu a liberdade a partir de um decreto da presidente Dilma Rousseff, que perdoa os presos que tenham tido comportamento exemplar na cadeia por 20 anos ininterruptos. Cabo Bruno teria fugido da cadeia por três vezes até 1991, mas depois disso não cometeu nenhuma falta indisciplinar.

Com uma renda não suficiente a princípio como pastor, Bruno informou que poderia fazer trabalho como artista plástico e planeja também fazer um curso profissionalizante “para o caso de emergência”.

“Embora eu tenha uma idade já meio avançada, Deus me deu saúde, sabedoria, uma mente boa, preservou minha mente", afirmou.

Livre, Bruno afirma que ficou com trauma da imprensa e prefere não mostrar o rosto. “Quanto mais eu puder evitar [ser exposto] é melhor”, afirmou.
Hoje, Bruno é querido pastor pelos colegas na prisão, de fala mansa e, segundo Deyse, “é um homem transformado”.

Bruno saiu de maneira discreta da penitenciária, escondido no banco de trás de um carro da Funap (Fundação de Amparo ao Preso), driblando os jornalistas.