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Uma defesa bíblica do impeachment

Se o cristão não pode apoiar a dissolução das autoridades constituídas, isso vale para todas as autoridades constituídas.

por Thiago Cortês-via gospelprime-

Teólogos e pastores proeminentes agora se debatem com a questão: pode o cristão apoiar um movimento de impeachment?

Alguns dizem que sim. Outros respondem que não. É uma questão legítima, e que não diz respeito apenas ao governo de Dilma Rousseff.

Se o cristão não pode apoiar a dissolução das autoridades constituídas, isso vale para todas as autoridades constituídas. Em bom português, se não podemos tirar Dilma do poder porque devemos ser submissos o mesmo vale para políticos de outros partidos e ideologias.

A consequência prática desta interpretação do famoso texto de Romanos é a total submissão a qualquer governo, seja ele democrático ou não. Se a submissão às autoridades deve ser absoluta, os cristãos que lutaram contra Hitler estavam em pecado.

Mas, acredito, esta é uma interpretação absolutamente equivocada.

Como é típico no meio evangélico, as pessoas sustentam sua posição em apenas um versículo, neste caso Romanos 13:1-2:  “Cada qual seja submisso às autoridades constituídas, porque não há autoridade que não venha de Deus; as que existem foram instituídas por Deus”.

É uma interpretação reducionista que ignora os versículos subsequentes que explicam que a autoridade instituída por Deus é instrumento do bem e que é necessário submeter-se a ela não por temor de castigo, mas também por dever de consciência.

É preciso sempre se perguntar: a autoridade à qual estou submetido é instrumento do bem? É uma autoridade a quem reconheço em minha consciência? A necessidade desta averiguação de consciência é enfatizada no seguinte versículo:

“É também por essa razão que pagais os impostos, pois os magistrados são ministros de Deus, quando exercem pontualmente esse ofício.” (Romanos 13:6-7)

Enfatizo aqui as palavras: “quando exercem pontualmente esse ofício”. Ou seja, quando os governantes agem incorretamente não podem mais ser vistos como ministros de Deus.

A Bíblia diz claramente que o próprio Deus se levanta contra autoridades ilegítimas. Há inúmeras passagens bíblicas que suportam a minha afirmação, mas aqui vou me deter em uma que mostra a ira de Deus contra governantes ilegítimos:

“Eis o que me diz o Senhor: Desce ao palácio do rei de Judá, e lá pronunciarás: Ouve a palavra do Senhor, rei de Judá, que ocupas o trono de Davi, tu, teus servos e teu povo que entrais por essas portas. Eis o que diz o Senhor: Praticai o direito e a justiça, e livrai o oprimido das mãos do opressor […] Se obedecerdes fielmente a esta ordem, continuarão a passar pelas portas deste palácio os reis herdeiros do trono de Davi, montados em carros e cavalos, com seus servos e seu povo. Se, porém, não escutardes estas palavras, juro-o por mim  – palavra do Senhor -, será reduzido a escombros este palácio” (Jeremias 22: 1-5)

O capítulo 22 de Jeremias demonstra sem qualquer dúvida que caso a autoridade se oponha aos princípios de Deus, que a instituiu, ela perde sua legitimidade. A autoridade legítima é aquela que obedece aos princípios divinos de justiça, honestidade, equidade, etc.

Mesmo que uma autoridade tenha legitimidade legal, é preciso se perguntar: ela está em obediência aos princípios divinos? A ordem terrena não é superior à ordem divina e há também inúmeros versículos que sustentam tal afirmação.

Na verdade, a obrigação moral de todo cristão é a de obedecer a Deus antes de obedecer aos homens. E os maiores heróis da Bíblia são justamente os que fizeram isso:

 “Trouxeram-nos, apresentando-os ao Sinédrio. E o sumo sacerdote interrogou-os, dizendo: Expressamente vos ordenamos que não ensinásseis nesse nome; contudo, enchestes Jerusalém de vossa doutrina; e quereis lançar sobre nós o sangue desse homem. Então, Pedro e os demais apóstolos afirmaram: Antes, importa obedecer a Deus do que aos homens”. (Atos 5:27-29)

É importante refletir também sobre o conceito de autoridade. Do ponto de vista político moderno, a autoridade máxima de um País é a sua Constituição, ou seja, é a ela que todos devem se submeter.

A autoridade máxima, portanto, é a Constituição.

Cidadãos de todos os partidos, ideologias e crenças devem se submeter, antes, à Constituição. Todo governo está debaixo da Constituição e dele não depende a estabilidade política e constitucional de um País. Depende da Constituição.

A Bíblia também tem várias passagens nas quais a corrupção é condenada. A ação de corruptos e corruptores jamais é relativizada por Deus, como é costume nos nossos tempos em que se diz “mas a corrupção não é só do meu partido” ou “não começou com a gente”:

“No meio de ti aceitam-se subornos para se derramar sangue; recebes usura e lucros ilícitos, e usas de avareza com o teu próximo, oprimindo-o. E de mim te esqueceste, diz o Senhor Deus. Eu certamente baterei as mãos contra o lucro desonesto que ganhastes” (Ezequiel 22:12-13)

“Os teus príncipes são rebeldes, companheiros de ladrões; cada um deles ama o suborno, e corre atrás de presentes. Não fazem justiça ao órfão, e não chega perante eles a causa das viúvas”. (Isaías 1:23)

“Pela justiça o rei estabelece a terra, mas o amigo de subornos a transtorna” (Provérbios 29:4)

“O ímpio acerta o suborno em secreto, para perverter as veredas da justiça”. (Provérbios 17:23)

“Também suborno não tomarás; porque o suborno cega os que têm vista, e perverte as palavras dos justos.” (Êxodo 23:8)

Para encerrar, apenas dois breves comentários de natureza política. Não sobre Dilma, pois creio que os irmãos lêem jornais e assistem ao noticiário. E vão ao supermercado. E pagam impostos. E pagam contas de luz e de água. E prezam pela democracia.

Quero apenas lembrar que um dos maiores juristas contemporâneos do Brasil, Ives Gandra Martins, ofereceu um parecer no qual demonstra que há, sim, base jurídica para o impeachment de Dilma Roussef. Não é golpe; é a aplicação da Constituição.

Mas quero falar do meio protestante.

Nos idos dos anos 1990 alguns líderes evangélicos progressistas aderiram ao “Fora FHC!”. Eles apoiaram o movimento pelo impeachment de FHC somente por fidelidade ideológica. São os mesmos que agora dizem que o “Fora Dilma!” é um golpe contra a democracia.

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É interessante notar que alguns proeminentes evangélicos progressistas até pouco tempo atrás aderiram também ao “Fora Alckmin”. São os mesmos que agora dizem que o movimento contra Dilma é golpista.

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Por sua vez, os “moderados” de plantão que agora lembram que estamos sujeitos às autoridades nada disseram quando o “Fora FHC!” era bradado por evangélicos progressistas que tinham todos os holofotes da mídia, mas arruinaram seus ministérios com dossiês falsos e adultérios.

O que posso dizer dos irmãos progressistas e dos “moderados”?

“Conheço as tuas obras, que nem és frio nem quente; quem dera foras frio ou quente! Assim, porque és morno, e não és frio nem quente, vomitar-te-ei da minha boca” (Apocalipse 3:15-16)

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