Mesmo sendo pacifista, pastor criou inimigos e pagou com a vida por defender ideias como igualdade racial e o fim da Guerra do Vietnã.
Por G1
Há exatos 50 anos, em 4 de abril de 1968, Martin Luther King Jr., ícone da luta pacífica pelos direitos civis dos negros nos Estados Unidos, era assassinado com um disparo no balcão do quarto de um hotel em Memphis, no Tennessee.
Adepto da filosofia da não-violência de Gandhi, quatro anos antes ele havia recebido o Nobel da Paz.
King começou em 1955 sua mobilização para pressionar o governo americano a declarar ilegal a política de discriminação racial nos estados do sul dos EUA , à qual os racistas responderam com violência.
Em 1963, 250 mil manifestantes marcharam para Washington, onde King fez seu famoso discurso “Eu tenho um sonho”. No ano seguinte, o presidente Lyndon Johnson aprovou uma lei proibindo toda discriminação racial.
Mas o pastor protestante teve oponentes poderosos. O chefe do FBI, John Edgar Hoover, colocou-o sob vigilância como comunista e, quando King se opôs à Guerra do Vietnã, ele entrou em desavença com Johnson.
Seu assassino, James Earl Ray, era um racista branco. Até hoje não está claro se ele agiu por conta própria ou se estava envolvido numa conspiração.
Polarizador
King foi também uma figura controversa em seu tempo — diferente do que se celebra hoje em dia com um feriado nacional nos EUA. “Ficou congelado no tempo, não como o homem que era em 1968, mas por sua imagem em agosto de 1963, quando fez seu discurso de ‘Eu tenho um sonho'”, avalia David Farber, professor de História da Universidade de Kansas, em entrevista à agência France Presse.
“É fácil para os americanos se esquecerem do quão polarizadora era a figura de King na década de 1960. Ele se transformou em uma figura realmente radical nos Estados Unidos, um oponente declarado da política externa americana, que exigia justiça não somente para os afro-americanos como para todos os pobres americanos”, explica.
Um momento crucial na trajetória de King foi o discurso feito em abril de 1967 em Nova York contra a Guerra do Vietnã, ano em que morreram mais de 11 mil soldados americanos. “King enfureceu todo o movimento de direitos civis, o governo e boa parte da estrutura política quando se manifestou contra a Guerra do Vietnã”, explica Henry Louis Taylor Jr., diretor do Centro de Estudos Urbanos da Universidade de Búfalo, também à France Presse.
Visão impopular
David Garrow, autor do livro “Bearing the Cross” sobre King, disse que sua oposição à guerra foi vista como “extremista” em um momento em que o sentimento contra a guerra não era “muito popular”.
“Nos últimos 12 meses de sua vida, King estava muito esgotado, muito pessimista, muito deprimido”, disse Garrow. “Disse, uma dezena de vezes ou mais, em seus últimos dois anos: ‘O sonho que tive em Washington em 1963 se transformou em um pesadelo'”.
Veja abaixo alguns trechos dos discursos mais importantes de King, conhecido por seu poder de retórica:
“Eu tenho um sonho: que meus quatro filhos um dia viverão em uma nação onde não serão julgados pela cor de sua pele, e sim por seu caráter”.
23 de agosto de 1968, na Marcha de Washington pelo Trabalho e pela Liberdade
“Eu me oponho à Guerra do Vietnã porque amo os Estados Unidos. Eu me pronuncio contra esta guerra, não com revolta, e sim com angústia e tristeza em meu coração, e principalmente com um desejo apaixonado de ver nosso querido país continuar sendo o exemplo moral do mundo. Falo contra esta guerra, porque estou decepcionado com os Estados Unidos, e não pode haver uma grande decepção quando não há um grande amor”.
30 de abril de 1967, na Igreja Riverside, em Nova York
“Todos temos o instinto maior do rufar dos tambores (…) A grande questão da vida é domar este instinto. É um bom instinto, se você não distorcê-lo e pervertê-lo. Não desista. Continue sentindo a necessidade de ser importante (…) Mas quero que você seja o primeiro no amor. Quero que você seja o primeiro em retidão moral. Quero que você seja o primeiro em generosidade”.
4 de fevereiro de 1968, na Igreja Batista Ebenezer, em Atlanta, Geórgia
“A verdadeira medida de um homem não é sua posição em circunstâncias convenientes e cômodas, e sim sua posição em tempos de desafios e controvérsias”.
No livro “Strength to Love”, de 1963
“Creio que a verdade desarmada e o amor incondicional terão a última palavra na realidade. É por isso que o bem temporariamente derrotado é mais forte que o mal triunfante”.
10 de dezembro de 1964, no discurso de aceitação do Prêmio Nobel da Paz, Oslo, Noruega
“Não sei o que acontecerá agora, se virão dias difíceis. mas realmente não me importa, porque estamos no cume da montanha. Como qualquer um, gostaria de viver uma vida longa. A longevidade tem seu lugar. Mas agora isso não me preocupa. Quero apenas fazer a vontade de Deus. E Ele me permitiu subir a montanha e olhar, e vi a Terra Prometida. Pode ser que não chegue lá com vocês, mas quero que saibam que, como povo, chegaremos à Terra Prometida. Por isso estou feliz esta noite. Nada me preocupa. Não temo nenhum homem. Meus olhos viram a glória do Senhor”.
3 de abril de 1968, no templo do bispo Charles Mason, Memphis, Tennessee, um dia antes de ser morto
Veja momentos importantes da vida de Martin Luther King:
- 15 de janeiro de 1929: nasce em Atlanta, no estado da Geórgia (sul dos Estados Unidos).
- 18 de junho de 1953: se casa com Coretta Scott. O casal teve quatro filhos.
- Dezembro de 1955: como pastor batista lidera o longo boicote de protesto contra a segregação racial nos ônibus de Montgomery, Alabama.
- Abril de 1963: detido por sua participação em manifestações contra a segregação, escreve a famosa “Carta de uma prisão de Birmingham”, na qual define sua luta pacífica contra o racismo.
- 28 de agosto de 1963: pronuncia o discurso “Eu tenho um sonho” diante de 250.000 manifestantes em Washington durante a Marcha pelo Trabalho e pela Liberdade.
- 14 de outubro de 1964: aos 35 anos, torna-se o vencedor do Prêmio Nobel da Paz mais jovem por sua resistência não violenta contra a segregação racial.
- 1966: muda-se para a periferia de Chicago para levar a luta ao norte do país.
- 1967: inicia uma campanha contra a guerra no Vietnã e a pobreza nos Estados Unidos.
- 4 de abril de 1968: assassinado em Memphis (Tennessee) aos 39 anos por James Earl Ray.