Categorias
Noticias

Em São Paulo, Dalai Lama diz ser um ‘bom cristão’ e promove seu livro

 

Líder religioso tibetano está no país e deu coletiva de imprensa nesta sexta.
Ele citou a China como mau exemplo no contexto do meio ambiente global.

Fábio TitoDo G1, em São Paulo

O Dalai Lama disse nesta sexta-feira (16), em entrevista coletiva em São Paulo, ser um "bom cristão" e aproveitou para fazer propaganda de seu novo livro, que nem sequer foi traduzido para o português.

Questionado se acredita haver uma maneira de as diferentes religiões conviverem em harmonia, ele respondeu que todas as crenças têm o mesmo objetivo, de construir paz interior.

"Um amigo australiano uma vez me descreveu como ‘um bom cristão’. Eu disse: sim, tudo bem. E lhe disse que ele era um bom budista", afirmou. Ele disse ainda não ser um bom praticante da meditação e das orações, mas que busca aplicar seus valores e crenças no cotidiano, o que, segundo ele, é o "mais importante".

O Dalai Lama dá entrevista nesta sexta-feira (16) em São Paulo (Foto: Fabio Tito/G1)O Dalai Lama dá entrevista nesta sexta-feira (16) em São Paulo (Foto: Fabio Tito/G1)

O tibetano repudiou o preconceito entre as religiões. "Há pessoas que não podem ouvir que um outro é muçulmano, por exemplo. Você precisa, antes, pegar o Corão (livro sagrado islâmico) e lê-lo, pode até compará-lo com a Bíblia para ver como eles trazem a mesma mensagem", declarou.

O líder tibetano brinca exibindo seu novo livro (Foto: Nacho Doce/Reuters)O líder tibetano brinca exibindo seu novo livro
(Foto: Nacho Doce/Reuters)

Livro
Em seguida, aproveitou para fazer propaganda de seu novo livro. "Eu mesmo tinha uma necessidade de entender essa questão melhor. Estudei e constatei que todas as religiões trazem a mesma mensagem, como está escrito no meu novo livro", disse, exibindo um exemplar em inglês.

Mas, ao ser informado por assessores que o livro ainda não foi traduzido para o português, ele brincou: "Então, o dinheiro de vocês não será gasto".

Entre uma pergunta e outra, enquanto o tradutor passava para o português as respostas dadas no inglês com forte sotaque, o líder budista mostrava seu bom humor fazendo poses para os fotógrafos.

China
Quando a pergunta foi sobre o debate ecológico entre as nações, o Dalai Lama fez uma breve menção à China, país que controla a região do Tibete e é contrário à representatividade política do monge budista.

"O cuidado com a importância ecológica está crescendo. Minha impressão é que os governos estão mais propensos a tomar decisões pelo meio ambiente. Mas há países que têm interesses nacionais maiores que os globais, como a China, e isso não é uma coisa boa para o mundo", afirmou.

No Brasil desde quinta-feira (15), quando proferiu uma palestra para empresários em São Paulo, o Dalai Lama está em sua quarta visita ao país. No sábado, ele realiza novas palestras antes de deixar o país.

Dalai Lama
Tenzin Gyatso, que é o 14º Dalai Lama seguindo o conceito de reencarnação do Budismo, é monge e doutor em filosofia budista. Ele luta pelos direitos dos tibetanos desde que partiu para o exílio na Índia em 1959, quando fracassou uma revolta contra o domínio chinês, exercido desde o início daquela década.

Trinta anos depois do início da luta, em 1989, o monge recebeu o Prêmio Nobel da Paz por suas tentativas de chegar a um acordo sobre o futuro do Tibete.

Atualmente, cerca de 140 mil tibetanos vivem no exílio, a maioria deles na Índia. O governo tibetano no exílio não é reconhecido formalmente por nenhum país.

Categorias
Estudos

Dalai Lama no Brasil: ‘Uma religião jamais será universal’

Budismo

veja.com

Em sua 4ª visita ao país, o líder espiritual tibetano defendeu a importância da coexistência entre diferentes abordagens religiosas, tema de seu último livro

Cecília Araújo

Dalai Lama Tenzin Gyatso está em São Paulo para uma série de palestras

Dalai Lama Tenzin Gyatso está em São Paulo para uma série de palestras (Frame/Folhapress)

"A diferença entre religiões é explorada por pessoas não bem intencionadas que visam à ascensão no poder"

O líder espiritual tibetano Tenzin Gyatzo, o atual Dalai Lama, é simpático, mas não excessivamente. Sua postura firme demonstra que não é utópico e tem plena consciência da realidade, tanto oriental quanto ocidental. Ele gosta de dar lições de vida e fazer piadas. Na frente das câmeras, brinca ao posar para fotos: tira os óculos, esconde o rosto atrás da tradicional roupa tibetana púrpura – e gargalha. Às vezes, também faz careta, mantendo o bom humor. Em sua quarta visita ao Brasil, para um ciclo de palestras em São Paulo, ele concedeu uma entrevista coletiva à imprensa, na qual falou principalmente de religiosidade. "Vim até aqui falar a vocês como um entre os 7 bilhões de seres humanos do planeta. Somos basicamente todos iguais, nos níveis físico e mental. Claro que temos diferenças de língua, raça e fé religiosa, mas tudo isso é secundário", iniciou sua fala ante os jornalistas, que ficaram restritos a questões sobre este e outros dois temas: negócios e ciência, deixando de fora qualquer assunto relacionado a política – mesmo após sua recente renúncia ao poder político no Tibete, no início de agosto, quando foi eleito o novo premiê do país, o advogado Lobsang Sangay.

Dalai Lama criticou os constantes conflitos religiosos, ressaltando a importância da harmonia e a consciência de igualdade. "A diferença entre religiões é explorada por pessoas não bem intencionadas que visam à ascensão no poder", lamentou. "Mesmo que tenham filosofias diferentes, as religiões defendem valores semelhantes para a conduta ética e trazem a mesma mensagem de amor, compaixão e perdão." Segundo ele, as ações dos humanos devem trazer conforto e prazer ao outro, não medo e dor. "Os sentimentos que são transmitidos voltam para você", enfatizou. Em seu novo livro, Toward a True Kinship of Faiths: How the World’s Religions Can Come Together (Em direção a um verdadeiro parentesco entre as crenças: como as religiões do mundo podem se unir, em tradução livre), ele fala exatamente dos traços comuns entre as religiões, tema que sempre lhe trouxe curiosidade. "Uma religião jamais será universal. Mesmo que fosse a melhor do mundo, não conseguiria suprir as necessidades espirituais de todos os seres humanos, pois as pessoas têm diferentes disposições mentais", observou, lembrando que, para alguns, a figura de um só criador não faz sentido, enquanto para outros, a própria religião é dispensável. "O importante é que os homens mantenham o bom senso e a ética. Dessa forma, a paz interior se estende para a família e a comunidade."

E definindo toda a população mundial como "irmãos e irmãs que compartilham a mesma casa", Dalai Lama aproveitou para entrar no tema sustentabilidade e elogiar a conscientização do Brasil que, segundo ele, é maior hoje do que era na época de sua primeira visita, em 1992. "Os governos estão mais entusiasmados com as questões ambientais. Em contrapartida, grandes países como a China e a Índia ainda priorizam os interesses nacionais em detrimento dos globais, o que não acho uma boa coisa", ponderou. Para ele, a promoção da paz e a proteção da natureza são igualmente importantes, como comer e beber. "Todos precisam das duas coisas." A mesma relação pode ser feita entre oração e meditação, que servem para recarregar as baterias, mas não são suficientes sem a prática de valores como amor e compaixão no dia-a-dia. "É importante não se deixar avassalar por sentimentos negativos, como raiva, ódio e medo, mesmo que não seja praticante", opinou. Aos jornalistas, deu um recado especial: "Vocês têm um papel importante da promoção desses valores, em meio às inúmeras catástrofes reportadas".

O Lama – Desde que assumiu o poder em 1950, aos 15 anos, Tenzin Gyatso se afastou da tradição "vajrayana" de isolamento e elegeu como missão espalhar pelo mundo os conceitos básicos do budismo e transformou a causa da libertação do Tibete em um tema mundialmente conhecido. Ele é o 14º de uma seita que está no poder desde o século XVII. Como todos seus antecessores, foi reconhecido como reencarnação do Dalai Lama quando criança, aos 3 anos, por meio de sonhos e presságios de monges budistas. Assim como o papa, ele é designado Sua Santidade. Sua forma de pregar a libertação do Tibete sem o uso da violência lhe rendeu um Nobel da Paz, em 1989. Sua primeira visita ao Brasil foi em 1992, durante a Eco-92. Os lamas são vistos pela população local como a reencarnação de Buda. Confira mais detalhes sobre o budismo e Dalai Lama na lista abaixo:

Status de papa

O Dalai Lama representa para os seguidores do budismo tibetano papel similar ao do papa para os católicos, ou mais do que isso: pois, para os fiéis daquela religião, os lamas são vistos como a reencarnação de Buda. Assim como o papa, ele é designado Sua Santidade. Uma característica marcante da versão tibetana do budismo é a participação intensa da população nos assuntos religiosos. No Tibete, o líder espiritual é venerado de tal forma que chega a dificultar o domínio chinês sobre sua cultura.

Categorias
Artigos

Chávez exalta religiosidade de olho na reeleição, dizem analistas

 

Claudia Jardim

De Caracas para a BBC Brasil

Atualizado em  14 de setembro, 2011 – 06:26 (Brasília) 09:26 GMT

Chávez participa de ritual no Palácio de Miraflores. Foto: AFP

Desde que descobriu câncer, presidente incorporou fé e religião a seu discurso

Desde que foi diagnosticado com câncer, o presidente da Venezuela Hugo Chávez incorporou a fé e a religião a seu discurso, mas para analistas ouvidos pela BBC Brasil, essa mudança de estilo responde a uma necessidade de recuperar popularidade.

Em suas escassas aparições públicas, a retórica de Chávez em defesa do socialismo tem cedido espaço ao misticismo. Especialistas afirmam que isto tem como objetivo a vitória nas eleições presidenciais de 2012, pleito no qual o presidente pretende ser reeleito.

"Com o favor de Deus, de nossos deuses indígenas, do manto da virgem e o espírito da savana (…), esse câncer não voltará nunca mais", disse Chávez durante um ritual indígena, realizado no último sábado no palácio de governo para, segundo os xamãs venezuelanos, curar o "grande cacique".

A Venezuela é um país de maioria católica, mas com forte crescimento no número de evangélicos – os venezuelanos também mesclam cultos africanos e indígenas em suas celebrações espirituais.

Em meio a essa diversidade, Chávez participou de um de um ritual africano, com tambores e cantos por sua recuperação. Ele também viu mais de cem jovens rasparem a cabeça em um ato ecumênico católico-evangélico em demonstração de "sacrifício a Deus", em troca da recuperação do presidente.

Para o analista político Nicmer Evans, professor da Universidade Central da Venezuela, a utilização da fé e do misticismo venezuelano é parte de uma estratégia eleitoral. "Chávez apela à fé para manter a conexão com a população, vínculo que se viu afetado por sua ausência no cotidiano", disse Evans à BBC Brasil.

Chávez, que acostumou a população à sua presença quase que diária na televisão e em atos públicos, teve de sair de cena em junho, para realizar o tratamento médico contra o câncer.

"(Chávez) tem de buscar um compensador místico-religioso para preencher esse vazio (na comunicação), que não é de poder, e sim, um vazio de Chávez."

Luis Vicente León, da consultoria Datanalisis

‘Prato principal’

De família católica, Chávez – que foi coroinha de Igreja quando criança – nunca escondeu seu lado religioso vinculado ao cristianismo. Em consequência do câncer, o que mudou foi a "dose" de espiritualidade, na opinião do diretor da consultoria Datanalisis, Luis Vicente León.

O analista afirma que a cultura místico-religiosa durante o governo Chávez sempre existiu, porém, "sempre foi o tempero, não o prato principal".

"Agora, o prato principal, que era essa presença praticamente onipresente na comunicação desaparece, e ele (o presidente) tem de buscar um compensador místico-religioso para preencher esse vazio, que não é de poder, e sim, um vazio de Chávez", disse.

Em julho, durante uma missa em que recebeu a unção dos enfermos, Chávez – que mantém uma tensa relação com a hierarquia da Igreja católica – disse sentir-se "o coroinha que sempre fui" e leu trechos da Bíblía durante a cerimônia.

Neste mesmo período, Chávez prometeu entregar US$ 22 milhões para a construção de um templo católico, no Estado de Táchira, com capacidade para quase 30 mil pessoas.

‘Milagre’

Nessa terça-feira, o presidente anunciou que se prepara para um quarto e talvez último ciclo de tratamento com quimioterapia e disse esperar estar "plenamente" recuperado da doença.

Parcialmente fora da cena política desde julho, Chávez admitiu, no entanto, que não poderá percorrer o país com o mesmo vigor colocado nas campanhas anteriores.

"Chávez recuperado, já como candidato, recorrendo o país, no ritmo que imponha as circunstâncias, mas também utilizando ao máximo a tecnologia que temos", disse o presidente.

Para Luis Vicente León, em uma campanha tão decisiva como as eleições presidenciais de outubro do próximo ano, "quanto mais místico, mais espiritual for o entorno do presidente agora, mais mágico será seu retorno".

"Chávez apela à fé para manter a conexão com a população, vínculo que se viu afetado por sua ausência no cotidiano."

Nicmer Evans, professor da Universidade Central da Venezuela

"Chávez prepara o cenário da ressureição e envolve a todos seus simpatizantes (que rezaram por ele) no milagre", disse o especialista.

Popularidade

De acordo com pesquisas de opinião realizada pela consultoria Hinterlaces, a popularidade do presidente venezuelano aumentou nos últimos meses, ao atingir 58% em setembro.

Este índice contrasta com a queda em sua aprovação que vinha sendo registrada, cujos indicadores flutuavam entre 44% e 48%. O pior indíce dos últimos anos foi registrado em março de 2010, quando apenas 37% dos venezuelanos diziam apoiar o presidente.

O câncer, a moderação do discurso – voltado à classe média e setores empresariais – e a tentativa de dar uma nova roupagem à gestão do Executivo com o lançamento de um mega projeto de construção de moradia popular teriam alavancado a popularidade do presidente nos últimos meses.

"Chávez diminuiu o volume ideológico e se favoreceu. Tem se comportado mais como um predicador que como um líder político", disse o analista Oscar Schemel, diretor da Hinterlaces.

Para esses especialistas, os pre-candidatos presidenciais da coalizão opositora, por sua vez, também acabaram "contaminados" pela onda religiosa vinda de Miraflores.

Na semana passada, pelo menos sete pré-candidatos participaram de atos de celebração de uma das santas padroeiras da Venezuela, a Virgem del Valle.

"Todos acabam amarrados no tipo de liderança de Chávez e tentam ser como ele", afirmou o analista Nicmer Evans. "Chávez, apesar da doença, continua influenciando a atuação de seus opositores."