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História do Movimento Batistas por Princípios

Transcrito pelo Pr. Angelo Medrado

História do Movimento Batistas por Princípios

Em 2020, nós, batistas brasileiros, na grande maioria pastores, preocupados com os rumos de nossa denominação, que tanto amamos, decidimos nos posicionar em relação a fatores
que entendemos como recentes ameaças às igrejas locais. Somos batistas que se definem como moderados ou conservadores teologicamente, mas preocupados com a ascenção do
movimento fundamentalista em solo brasileiro.
Nos últimos anos, percebemos como exemplos dessa escalada na Convenção Batista Brasileira (CBB), eventos como (a) o convite da CBB ao Pr. Paige Patterson (fundamentalista de renome
nos EUA) para ser um dos oradores de sua Assembleia em Gramado em 2015; (b) a assinatura de convênio entre o Seminário Teológico Batista do Sul do Brasil e o Southwestern Baptist Theological Seminary, em Fort Worth (Texas/EUA); (c) o apoio de líderes denominacionais a uma agenda política associada ao fundamentalismo, com a demonização de partidos considerados
de esquerda (abrangendo falas de púlpitos durantes campanhas políticas; o enaltecimento da Operação Lava-Jato em Assembleia da CBB; a convocação de jejum e oração pela manutenção de prisão em segunda instância de ex-presidente da República); e (d) a campanha lançada no Dia da Bíblia para que homens vestissem azul e mulheres rosa, com claro contorno político-partidário.
Estas ações indicam uma preocupante tendência no sentido de mudar o perfil histórico da denominação, de um polo para outro.

O que antes sempre foi marcado por uma feição plural da denominação batista no Brasil, agora, nos parece, passou a sofrer uma tentativa de uniformização (inclusive literal) das diversas tendências do povo batista.

Aqueles que se mantiveram fiéis às suas tradições e matrizes teológicas começaram a ser perseguidos ou, pelo menos, silenciados, prejudicando o exercício de seus ministérios e, consequentemente, o
povo batista.

Nós, do Movimento Batistas por Princípios (MBP), refletindo sobre essa situação, resistimos às tentativas de imposição de uma agenda fundamentalista na CBB, entendendo que o respeito à pluralidade em nosso meio é saudável e preserva a integridade da denominação. Rejeitamos e condenamos os sinais de apoio político da denominação a candidaturas ou a qualquer governo, como percebemos, por exemplo, em recentes Assembleias anuais da CBB.

Entendemos que a denominação precisa voltar a valorizar uma configuração mais horizontal, em detrimento de aspirações piramidais próprias de governos episcopalizantes, estranhos ao melhor jeito de ser batista.

Para isso, buscamos resgatar os princípios que nortearam a formação do pensamento batista ao longo da história, conscientes de que os problemas que enfrentamos se devem, em grande parte, ao esquecimento dessa história e dos Princípios Batistas.

Estamos conscientes de que estamos num momento crucial da nossa história denominacional, bem como do País, e que há, portanto, uma necessidade de revisitarmos as bases que sedimentaram a trajetória da denominação.

Assim, o MBP entende que a CBB precisa reconsiderar posicionamentos para se reencontrar com o seu próprio ethos.

Fazendo isso, a denominação primará pelo respeito à autonomia das Igrejas Batistas e terá papel ainda mais significativo como voz Batista de convergência quando, em consonante coerência com 0 Evangelho de Jesus Cristo, se fizer ouvir a partir dos temas que são sensíveis à sociedade brasileira.

Compreendemos que a palavra de ordem que faz parte do “DNA batista” é “liberdade”.

Respeitamos as diferentes vocações das igrejas, reveladas em suas ênfases e prioridades.

Por isso pensamos que a CBB deve respeitar a autonomia, valorizar as lideranças locais, promovendo treinamento, investindo em capacitação para as igrejas.

Acreditamos em aglutinação de esforços. Por isso desejamos que a CBB atue mais como uma aglutinadora, catalizadora, potencializadora dos esforços das igrejas locais, e menos como uma distribuidora de programas.

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Ed Rene Kivitz fala de mágoa, ressentimento e conflitos na família

 

Rene Kivitz

SEM PERDÃO NÃO EXISTE AMANHÃ

Alguém já disse que a família é o lugar dos maiores amores e dos maiores ódios. Compreensível: quem mais tem capacidade de amar, mais tem capacidade de ferir. A mão que afaga é aquela de quem ninguém se protege, e quando agride, causa dores na alma, pois toca o ponto mais profundo de nossas estruturas afetivas. Isso vale não apenas para a família nuclear: pais e filhos, mas também para as relações de amizade e parceria conjugal, por exemplo.

Em mais de vinte anos de experiência pastoral observei que poucos sofrimentos se comparam às dores próprias de relacionamentos afetivos feridos pela maldade e crueldade consciente ou inconsciente. Os males causados pelas pessoas que amamos e acreditamos que também nos amam são quase insuperáveis. O sofrimento resultado das fatalidades são acolhidos como vindos de forças cegas, aleatórias e inevitáveis. Mas a traição do cônjuge, a opressão dos pais, a ingratidão dos filhos, a rixa entre irmãos, a incompreensão do amigo, nos chegam dos lugares menos esperados: justamente no ninho onde deveríamos estar protegidos se esconde a peçonha letal.

Poucas são minhas conclusões, mas enxerguei pelo menos três aspectos dessa infeliz realidade das dores do amar e ser amado. Primeiro, percebo que a consciência da mágoa e do ressentimento nos chega inesperada, de súbito, como que vindo pronta, completa, de algum lugar. Mas quando chega nos permite enxergar uma longa história de conflitos, mal entendidos, agressões veladas, palavras e comentários infelizes, atos e atitudes danosos, que foram minando a alegria da convivência, criando ambientes de estranhamento e tensões, e promovendo distâncias abissais.

Quando nos percebemos longe das pessoas que amamos é que nos damos conta dos passos necessários para que a trilha do ressentimento fosse percorrida: um passo de cada vez, muitos deles pequenos, que na ocasião foram considerados irrelevantes, mas somados explicam as feridas profundas dos corações.

Outro aspecto das dores do amar e ser amado está no paradoxo das razões de cada uma das partes. Acostumados a pensar em termos da lógica cartesiana: 1 + 1 = 2 e B vem depois de A e antes de C, nos esquecemos que a vida não se encaixa nos padrões de causa e efeito do mundo das ciências exatas. Pessoas não são máquinas, emoções e sentimentos não são números, relacionamentos não são engrenagens. É ingenuidade acreditar que as relações afetivas podem ser enquadradas na simplicidade dos conceitos certo e errado, verdade e mentira, preto e branco. A vida é zona cinzenta, pessoas podem estar certas e erradas ao mesmo tempo, cada uma com sua razão, e a verdade de um pode ser a mentira do outro. Os sábios ensinam que “todo ponto de vista é a vista de um ponto”, e considerando que cada pessoa tem seu ponto, as cores de cada vista serão sempre ou quase sempre diferentes. Isso me leva ao terceiro aspecto.

Justamente porque as feridas dos corações resultam de uma longa história, lida de maneiras diferentes pelas pessoas envolvidas, o exercício de passar a limpo cada passo da jornada me parece inadequado para a reconciliação. Voltar no tempo para identificar os momentos cruciais da caminhada, o que é importante para um e para outro, fazer a análise das razões de cada um, buscar acordo, pedir e outorgar perdão ponto por ponto não me parece ser a melhor estratégia para a reaproximação dos corações e cura das almas.

Estou ciente das propostas terapêuticas, especialmente aquelas que sugerem a necessidade de re–significar a história e seus momentos específicos: voltar nos eventos traumáticos e dar a eles novos sentidos. Creio também na cura pela fala. Admito que a tomada de consciência e a possibilidade de uma nova consciência produzem libertações, ou, no mínimo, alívios, que de outra maneira dificilmente nos seriam possíveis. Mas por outro lado posso testemunhar quantas vezes já assisti esse filme, e o final não foi nada feliz. Minha conclusão é simples (espero que não simplória): o que faz a diferença para a experiência do perdão não é a qualidade do processo de fazer acordos a respeito dos fatos que determinaram o distanciamento, mas a atitude dos corações que buscam a reaproximação. Em outras palavras, uma coisa é olhar para o passado com a cabeça, cada um buscando convencer o outro de sua razão, e bem diferente é olhar para o outro com o coração amoroso, com o desejo verdadeiro do abraço perdido, independentemente de quem tem ou deixa de ter razão. Abraços criam espaço para acordos, mas a tentativa de celebrar acordos nem sempre termina em abraços.

Essa foi a experiência entre José e seus irmãos. Depois de longos anos de afastamento e uma triste história de competições explícitas, preferências de pai e mãe, agressões, traições e abandonos, voltam a se encontrar no Egito: a vítima em posição de poder contra seus agressores. José está diante de um dilema: fazer justiça ou abraçar. Deseja abraçar, mas não consegue deixar o passado para trás. Enquanto fala com seus irmãos sai para chorar, e seu desespero é tal que todos no palácio escutam seu pranto. Mas ao final se rende: primeiro abraça e depois discute o passado. Essa é a ordem certa. Primeiro, porque os abraços revelam a atitude dos corações, mais preocupados em se (re)aproximar do que em fazer valer seus direitos e razões. Depois, porque, no colo do abraço o passado perde força e as possibilidades de alegrias no futuro da convivência restaurada esvaziam a importância das tristezas desse passado funesto.

Quando as pessoas decidem colocar suas mágoas sobre a mesa, devem saber que manuseiam nitroglicerina pura. As palavras explodem com muita facilidade, e podem causar mais destruição do que promover restauração. Não são poucos os que se atrevem a resolver conflitos, e no processo criam outros ainda maiores, aprofundam as feridas que tentavam curar, ou mesmo ferem novamente o que estava cicatrizado. Tudo depende do coração. O encontro é ao redor de pessoas ou de problemas? A intenção é a reconciliação entre as pessoas ou a busca de soluções para os problemas? Por exemplo, quando percebo que sua dívida para comigo afastou você de mim, vou ao seu encontro em busca do pagamento da dívida ou da reaproximação afetiva? Nem sempre as duas coisas são possíveis. Infelizmente, minha experiência mostra que a maioria das pessoas prefere o ressarcimento da dívida em detrimento do abraço, o que fatalmente resulta em morte: as pessoas morrem umas para as outras e, consequentemente, as relações morrem também. A razão é óbvia: dívidas de amor são impagáveis, e somente o perdão abre os horizontes para o futuro da comunhão. Ficar analisando o caderno onde as dívidas estão anotadas e discutindo o que é justo e injusto, quem prejudicou quem e quando, pode resultar em alguma reparação de justiça, mas isso é inútil – dívidas de amor são impagáveis.

Mas o perdão tem o dia seguinte. Os que recebem perdão e abraços cuidam para não mais ferir o outro. Ainda que desobrigados pelo perdão, farão todo o possível para reparar os danos do caminho. Mas já não buscam justiça. Buscam comunhão. Já não o fazem porque se sentem culpados e querem se justificar para si mesmos ou para quem quer que seja, mas porque se percebem amados e não têm outra alternativa senão retribuir amando. As experiências de perdão que não resultam na busca do que é justo desmerecem o perdão e esvaziam sua grandeza e seu poder de curar. Perdoar é diferente de relevar. Perdoar é afirmar o amor sobre a justiça, sem jamais sacrificar o que é justo. O perdão coloca as coisas no lugar. E nos capacita a conviver com algumas coisas que jamais voltarão ao lugar de onde não deveriam ter saído. Sem perdão não existe amanhã.

06-06-16 013

Rev. Ângelo Medrado, Bacharel em Teologia, Doutor em Novo Testamento, referendado pela International Ministry Of Restoration-USA e Multiuniversidade Cristocêntrica é presidente do site Primeira Igreja Virtual do Brasil e da Igreja Batista da Restauração de Vidas em Brasília DF., ex-maçon, autor de diversos livros entre eles: Maçonaria e Cristianismo, O cristão e a Maçonaria,A Religião do antiCristo, Vendas alto nível, com análise transacional e Comportamento Gerencial.