Tradicionalmente, para que alguém seja consagrado ao pastoreio é necessário que passe por uma série de consagrações a diversos cargos e funções na Igreja, como se estivesse cumprindo um “plano de carreiras” eclesiástico, em que, a cada nova ascensão há uma promoção eclesiástica até que se atinja, via de regra, o cargo máximo na Igreja, ou seja, o de Pastor. Mas será que há respaldo bíblico para tal, ou esta é apenas mais uma criação humana que mistura o material com o espiritual em uma simbiose confusa e extra bíblica?
De início, façamos uma análise simples e direta do texto escrito pelo Apóstolo Paulo, em sua epístola à Igreja de Éfeso: “E ele mesmo chamou uns para apóstolos, e outros para profetas, e outros para evangelistas, e outros para pastores e mestres” Ef 4:11. Ora, a partir da análise desse texto, verifica-se que não se trata de uma gradação, ou mesmo de pré-requisitos para que se alcance determinado cargo ou função na Igreja. Aproveitemos para deixar as coisas mais claras: ao invés de “cargos” na Igreja, deveríamos falar mais de “chamado” por Deus para o desempenho de atividades delegadas por Ele no seu Corpo. Voltando ao ponto da gradação, se ela existisse nesse texto, então se deveria ser apóstolo antes de pastor? Ou pastor antes de mestre? Definitivamente, gradação não é o significado contido nesse versículo.
Se estamos falando de chamado, as coisas começam a tomar outra conotação. As escolhas passarão a ser mais espirituais, ou ao menos deveriam, onde Deus é quem escolhe e chama cada um para determinado propósito em Seu Corpo. Sendo o chamado de Deus algo certo, definido e pré-determinado pelo Senhor, não faz o menor sentido que alguém peregrine por uma “escada” eclesiástica para que, então, possa ser consagrado ao seu chamado. E o pior é que, muitas vezes, consagra-se alguém para uma função diante do Corpo de Cristo totalmente diferente de seu verdadeiro chamado!
Veja, e apenas para exemplificar, pastoreio tem como principais funções o cuidado de ovelhas, o apascentar ovelhas, a proteção e a direção de um grupo de pessoas colocadas por Deus aos seus cuidados, com base na Palavra e no amor. Já o evangelista tem como atividades principais a pregação do evangelho, o exercício de diversas atividades de evangelismo, sejam de rua, em Igrejas, nos lares, e em todo lugar e tempo. É como se o evangelista saísse a buscar ovelhas para o pastor cuidar e apascentar. É obvio que o evangelista também discipula pessoas, o que não se confundo com o chamado de pastor por parte de Deus. São duas atividades totalmente diferentes, porém complementares. Então, se o chamado de alguém é o pastoreio, por que ele deve primeiro ser consagrado como evangelista? Por que se deve consagrar alguém como evangelista apenas para se cumprir um “plano de carreiras” dentro da Igreja sem que essa seja a vontade de Deus? Por outro lado, por que consagrar alguém como pastor, se o seu chamado é para evangelista? O que falar então dos missionários e presbíteros?
Se o chamado é de Deus, não estaríamos, a partir de uma criação humana, “chamando” alguém para algo que o próprio Deus não chamou? E se Jesus é o Senhor da Igreja, por que nos achamos no direito de chamar alguém para o exercício de algo no Seu Corpo sem que essa seja a vontade do próprio Cristo? Complicado, não?
Outro mito vivido e instituído na Igreja é que há uma hierarquia entre pastores, evangelistas, mestres e profetas. Mais uma vez voltando à nossa baliza de fé (A Bíblia Sagrada), não é o que se vê no texto de Efésios supramencionado. O evangelista não é hierarquicamente inferior ao pastor, o pastor não é hierarquicamente inferior ao mestre, e o mestre não é hierarquicamente inferior ao evangelista. Essa hierarquia é mais uma criação humana. O que há, de fato, é a necessidade de submissão à liderança da Igreja pelo fato de Deus ter colocado tal liderança para cuidar do rebanho, mas não por causa da função eclesiástica em si. Naturalmente, a liderança da Igreja é de um pastor e, em alguns casos, de presbíteros ou missionários.
Veja o exemplo do Billy Graham, homem cheio do Espírito Santo que pregou para quase 200 milhões de pessoas, tinha a função eclesiástica de evangelista. Nunca se intitulou pastor, principalmente porque tinha plena convicção de seu chamado diante de Deus. Será que o fato de Billy Graham não ter sido consagrado ao pastoreio o faz hierarquicamente inferior ao pastor? Será que ele tinha menos unção da parte de Deus por causa disso? Afirmo veementemente que não! Repito, o evangelista e o pastor têm chamados específicos diante de Deus, e não faz nenhum desses melhor ou maior do que o outro. Na verdade, o tipo de hierarquia sobre a qual me refiro (fundada na vaidade e na opressão) é totalmente contrária aos ensinos de Jesus, haja vista que o próprio Mestre disse: o que quiser ser maior, que seja o menor.
Quando se tem uma pessoa cujo chamado é para evangelista, e se consagra ao pastoreio, está-se a extrapolar a vontade e o chamado de Deus, e vice-versa. Infelizmente, existe uma verdadeira “escada do poder” dentro das Igrejas, onde o plano de ascensão já se encontra previamente definido. Muitas vezes, tem-se até o tempo em que o candidato desempenhará tal e tal atividade, até que se chegue ao tão almejado pastoreio, muitas vezes, sem que o chamado de Deus seja esse.
Vejo duas causas para esse equívoco: (1) Falta de certeza diante de Deus, obtida por meio da oração, quanto ao seu chamado por parte do Senhor; e a (2) Instituição de “cargos” a serem obrigatoriamente cumpridos até que se chegue ao desempenho das atividades atinentes ao chamado de Deus.
Enfim, precisamos voltar às Escrituras Sagradas, não internalizando a estrutura hierarquizada e piramidal tão comum nas estruturas seculares. Precisamos entregar a Jesus, de forma verdadeira e sincera, o pleno senhorio da Igreja!
Que Jesus tenha misericórdia de nós!