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RELATÓRIO: 12 IRANIANOS MORTOS EM GREVE ISRAELENSE NA SÍRIA; TOTAL SOBE PARA 21

O relatório afirmou ainda que três esquadrões de jatos israelenses realizaram o ataque às posições iranianas
JERUSALEM POST PESSOAL
Baterias de defesa aérea síria respondendo ao que a mídia estatal síria disse serem mísseis israelenses

Baterias sírias de defesa aérea respondem ao que a mídia estatal síria disse serem mísseis israelenses contra Damasco, em uma foto tirada no dia 21 de janeiro de 2019. (Crédito da foto: STR / AFP)

Doze soldados pertencentes à Guarda Revolucionária do Irã foram mortos nos ataques aéreos israelenses de domingo no Aeroporto Internacional de Damasco, informou nesta terça-feira a ONG britânica Syrian Observatory for Human Rights. 

O relatório disse que 21 pessoas foram mortas no total, entre elas seis membros das forças do regime de Bashar Assad e 15 não-sírios. Dos 15 não-sírios, 12 eram forças iranianas, segundo o relatório. O relatório afirmou ainda que três esquadrões de jatos israelenses realizaram o ataque às posições de Syiran.

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Como a Síria chegou a este ponto

Vista do bairro al-Qadam, em Damasco, capital da Síria (Foto: STRINGER/AFP)
A trágica combinação de um conflito étnico e sectário, da conivência internacional e, acima de tudo, do sofrimento de inocentes
POR ANDREW TABLER, THE ATLANTIC; TRADUÇÃO POR MARIANA NÂNTUA

Em março de 2011, quatro crianças na cidade de Daraa, no sudoeste do país, grafitaram num muro “Chegou sua vez, Doutor” — uma previsão não tão sutil de que o regime do presidente da Síria, Bashar al-Assad, um oftalmologista que estudou na Inglaterra e autodenominado reformista, acabaria do mesmo jeito que o regime de Ben Ali, na Tunísia, o de Mubarak, no Egito, e, eventualmente, o de Gaddafi, na Líbia. Mas a história da Síria seria diferente.

A repressão do governo começou aos poucos. O serviço de segurança de Assad prendeu os quatro grafiteiros, recusando-se a informar aos pais onde eles estavam. Depois de duas semanas de espera, os moradores de Daraa — conhecidos por serem diretos e passionais — realizaram protestos, exigindo a liberação das crianças. O regime retaliou disparando tiros e matando manifestantes, sendo o primeiro a derramar sangue numa guerra que já levou à morte cerca de meio milhão de pessoas. Cada novo funeral trazia mais oportunidades para protestos — e para a represália violenta do governo.

As manifestações se espalharam rapidamente a outras cidades — como Homs, Damasco, Idlib—, incendiando o que é, ao menos no nome, a República Árabe da Síria. A dinâmica fundamental que levou a essas ondas de protestos árabes — uma população jovem crescente e um regime repressivo e rígido, incapaz de mudanças — foi consistente em vários países. Mas os efeitos foram bastante diferentes, e mais ferozes ainda, na Síria, onde a esperança inicial de que Assad seguiria o caminho de outros ditadores foi desmoronada com as ruínas das cidades antigas e com as vidas despedaçadas de seu povo. A progressão da brutalidade do regime, desde a contratação de franco-atiradores para matar manifestantes que exigiam liberdade e dignidade até ataques a cidades inteiras com uso de armas químicas, ocorreu em tempo real, com o mundo todo assistindo.

Agora o mundo observa novamente, por meio de fragmentos de mensagens em redes sociais, o que parece ter sido um ataque com armas químicas a um reduto de rebeldes. Também assiste às investidas dos Estados Unidos e aliados em retaliação e ouve as alegações do Pentágono de que o bombardeio de três instalações associadas ao programa de armas químicas de Assad foi um sucesso. A história da Síria, partindo do grafite e passando pela quase derrubada de seu ditador até a retomada de controle desse mesmo tirano sobre um país despedaçado, é uma história de conflito étnico, conivência internacional e, acima de tudo, sofrimento de civis. E não vai acabar tão cedo; na verdade, está entrando em uma nova fase, talvez ainda mais perigosa.

Sírios andam de moto ao longo de uma rua destruída em Douma. Exército sírio declarou que todas as forças antirregime deixaram oleste de Ghouta, após uma ofensiva de dois meses contra os rebeldes (Foto: LOUAI BESHARA/AFP)

Há tempos que pessoas influentes, com poder de decisão, têm visto o regime de Assad como um modelo sombrio da estabilidade do Oriente Médio, mas em 2011 consideraram, subitamente, que o “poder do povo” poderia levar à queda do presidente na Síria, como ocorreu com outros déspotas árabes. Esse governo, porém, possuía algo que os outros não tinham. Estratégias de “resistência popular” são eficazes contra sistemas autoritários, cuja liderança faz parte da maioria étnica e sectária do país, como no Egito. Soldados que são ordenados a apontar suas armas a manifestantes enfrentam uma escolha: atirar em seus companheiros no protesto ou auxiliar na derrubada dos comandantes. Isso causa uma ruptura no Exército e nos serviços de segurança, o que pode levar a uma derrubada do regime.

Entretanto, o governo de Assad é de minoria com uma certa fortaleza de interesses sectários em volta dele. A minoria alauíta encontra-se no núcleo, seguido por outras ao redor (cristãos, xiitas etc.), até chegar finalmente aos sunitas, que representam a maioria na Síria. O Exército e os serviços de segurança, compostos por minorias, acabam ficando distantes da maioria sunita, o que os torna mais inclinados a atirar nos manifestantes do que a tirar seus companheiros do poder. Isso protegeu Assad contra o tipo de ruptura que derrubou Ben Ali e Mubarak.

Mas esse fato evidentemente não foi levado em conta pelo presidente Obama quando, em agosto de 2011, declarou que Assad deveria “afastar-se do cargo”, como se o líder da Síria fosse magicamente sair por conta própria. Para acelerar o processo, Obama recomendou que aliados europeus e da Liga Árabe adotassem o mesmo discurso e uma série de sanções ao regime sírio, particularmente proibindo a importação de petróleo, cujo setor é um dos mais lucrativos do país. O que faltava era um plano para remover Assad, caso ele não saísse de maneira pacífica.

E ele não iria sair. No segundo semestre de 2011 e na primeira metade de 2012, várias iniciativas da ONU falharam e não conseguiram estabelecer um cessar-fogo sustentável ou uma solução para as hostilidades. Enquanto governos ocidentais apelavam aos sírios para que se manifestassem de forma pacífica, o exército do regime aumentou a quantidade de franco-atiradores, de milicianos de minorias chamados de “fantasmas” e de aeronaves de asas rotativas e fixas, causando um aumento vertiginoso no número de mortes. Mais e mais sírios pegaram em armas para se defender e centenas de milícias locais se organizaram sob a bandeira do Exército Livre da Síria (ELS). A insígnia inclui a antiga bandeira nacionalista, mas o ELS era mais uma franquia que um exército de verdade.

A revolta transformou-se numa guerra civil. Quando, no verão de 2012, a Rússia e os Estados Unidos ofereceram um plano de transição para ajudar a dar um fim à violência, ambos os lados da luta ignoraram a ideia, achando que poderiam derrotar o outro no campo militar. Inclusive, parecia que os rebeldes estavam com vantagem: em julho daquele ano, um grupo conseguiu tomar metade de Aleppo, o centro industrial e a maior cidade da Síria. A partir daquele momento, estabeleceu-se um padrão: quando o regime enfrentava perdas severas, recorria a medidas extremas. As forças de Assad em Aleppo resistiram, mantendo o domínio da parte ocidental da cidade e disparando mísseis Scud em bases rebeldes; tornaram-se o segundo maior usuário, depois de Najibullah, no Afeganistão, a lançar essas armas contra seu próprio povo. O número de mortes e o fluxo de refugiados aumentaram consideravelmente.

Crianças mortas, supostamente por gases que afetam os nervos, após um ataque em Ghouta, perto de Damasco, em 21 de agosto de 2013 (Foto: NURPHOTO/CORBIS/GETTY IMAGES)

A diplomacia foi ofuscada pela batalha, e os Estados Unidos e aliados encaravam decisões difíceis. Em primeiro lugar, o que fazer com a oposição da Síria, na qual grupos jihadistas cresciam rapidamente, e quais desses poderiam se fortalecer na ausência de esforços externos que cercariam e armariam a oposição nacionalista. Obama, entretanto, rejeitou esses planos. Em vez disso, foi dada a decisão auxiliar, tão importante quanto desastrosa, de deixar que os aliados regionais dos americanos armassem a oposição. Abriu-se um fluxo de dinheiro proveniente de países do Golfo Pérsico, dividindo ainda mais aqueles que lutavam contra Assad e fortalecendo grupos salafistas e jihadistas entre eles.

Em segundo lugar, algo que acarretaria um ponto crítico na guerra: relatórios de inteligência dos Estados Unidos afirmavam que Assad estava preparado para intensificar ainda mais os ataques, usando sua reserva de armas químicas; naquela altura, calculava-se que fosse a maior da região, se não do mundo. Em 20 de agosto de 2012, numa coletiva de imprensa, Obama declarou que “a movimentação e o uso de armas químicas ultrapassariam uma linha vermelha para nós”. Enquanto a guerra seguia no segundo semestre, mais relatórios e amostras indicavam que o regime de Assad havia começado a usar agentes químicos em baixa concentração.

Antigo anfiteatro romano, listado como Patrimônio Mundial da Unesco, na província síria do sul de Daraa Bosra al-Sham, depois que foi inundado após fortes chuvas na região (Foto: MOHAMAD ABAZEED/AFP)

Naquele momento, o número de mortes já estava altíssimo, e a estimativa do Observatório Sírio dos Direitos Humanos (OSDH) era de cerca de 50 mil mortos até o fim de 2012 e quase meio milhão de refugiados.

A Síria estava afundando rapidamente. Indícios de uso de armas químicas acumulavam-se, refugiados escapavam e dinheiro continuava a chegar até grupos jihadistas, incluindo aquele que se tornaria, no futuro, o Estado Islâmico (EI). Novos combatentes entravam em campo. O Hezbollah e as milícias com apoio iraniano operavam com o regime de Assad, enquanto no nordeste quem mandava eram os guerreiros curdos, numa tentativa de assegurar sua própria autonomia. Enquanto o país se despedaçava, organizações terroristas preenchiam vazios de ambos os lados.

Até a metade de 2013, grupos de oposição ganharam ainda mais espaço em Damasco, capital da Síria. Por desespero militar ou por brutalidade pura, Assad dobrou o uso de armas químicas. Em 21 de agosto de 2013, quase um ano após Obama delimitar a fatídica “linha vermelha”, os militares sírios lançaram foguetes cheios de sarin em Ghouta, na região leste de Damasco, um ataque que, de acordo com estimativas dos Estados Unidos, matou cerca de 1.400 civis. Enquanto navios de guerra reuniam-se na costa da Síria para uma possível retaliação, Obama voltou atrás sob pressão do Congresso e de sua base de apoio, optando pela proposta da Rússia, que supostamente livraria a Síria de armas químicas.

Manifestante pró-governo com foto do presidente sírio Bashar al-Assad, durante protesto contra ataques dos Estados Unidos em represália ao suposto uso de armas químicas (Foto: MOHAMMED HAMOUD/GETTYIMAGES)

Essa reviravolta dramática acarretou, para os Estados Unidos, a dissipação do pouco apoio que ainda tinham da oposição síria. Numa viagem ao sul da Turquia naquele período, conversei com representantes da oposição, que me disseram que estavam furiosos com a decisão. Muitos acreditavam que Assad havia utilizado armas químicas e saído impune, mas a maioria estava surpresa de que Washington acreditasse que o acordo impediria o regime sírio de fazer tudo de novo — uma conclusão tragicamente presciente.

O fluxo de refugiados atingiu 2 milhões em setembro de 2013.

Como era de se esperar, o EI se expandiu pela Síria e pelo Iraque. Em 2014, seu território tinha aproximadamente o tamanho da Grã-Bretanha, e os militantes agora estavam ameaçando não só o regime de Assad como também o Iraque, no qual Washington havia gastado bilhões de dólares para remendar grosseiramente. Foi nesse momento que o governo Obama decidiu atingir a Síria. Enquanto manchetes internacionais focavam na execução de americanos reféns do EI, mais de 76 mil sírios foram mortos apenas em 2014, o maior número de mortes anuais do conflito, e 1,3 milhão de sírios fugiram para países vizinhos. Centenas de milhares tiveram de se deslocar dentro da Síria também.

Os Estados Unidos não estavam mirando diretamente em Assad — embora Obama tivesse dado início a um programa secreto para armar parte da rebelião —, mas a força do regime estava diminuindo à medida que rebeldes apoiados pelos americanos chegavam ao centro das operações alauítas, ameaçando a base sectária do presidente sírio. Talvez isso explique a resistência de Assad ao acordo das armas químicas, perdendo prazos para mover suas reservas para fora do país mesmo enquanto vinham à tona relatórios que afirmavam que ele não havia declarado todas elas.

Alarmes disparavam em Moscou, mas por causa de outro problema. A preocupação não era com o ritmo da implementação do acordo, mas com seu aliado sírio, que se encontrava numa posição perigosa: Assad tinha um número limitado de tropas que poderia preparar para combate e estava perdendo território mesmo com a ajuda de milícias apoiadas pelos iranianos. Poucos dias após os Estados Unidos assinarem o acordo nuclear com o Irã em 2015, Qassem Suleimani, comandante das operações externas do Exército dos Guardiães da Revolução Islâmica, viajou a Moscou; em cerca de um mês, a Rússia havia estabelecido uma base que ameaçava o domínio alauíta do distrito de Lataquia, na costa do Mar Mediterrâneo. Durante o outono de 2015, aeronaves russas derrubaram bombas “de mentira” da época da Guerra do Vietnã em apoio ao governo de Assad e a forças iranianas por toda a Síria, revertendo lentamente as perdas do regime no distrito e permitindo que grupos do presidente sírio e dos iranianos marchassem até Aleppo.

Mais 1 milhão de sírios fugiram do país, muitos deles indo além da Turquia, para vários países europeus. Mais de 55 mil morreram em 2015, aumentando o total de mortos no conflito para mais de 250 mil pessoas, com uma estimativa de mais 100 mil mortes não documentadas.

Os Estados Unidos, agora encarregados de derrotar o EI e apoiar a oposição síria, cederam. Isso fez com que a Rússia e o Irã tentassem firmar um cessar-fogo e conversar sobre o fim da guerra — ainda que os russos continuassem a alertar a respeito da posição de rebeldes, permitindo que o restante do exército de Assad e das milícias patrocinadas por iranianos, incluindo o Hezbollah, avançasse contra eles. No verão de 2016, essa força híbrida cercou e pulverizou o leste de Aleppo. Os Estados Unidos passaram a assistir a um de seus aliados desafiar o outro, enquanto a Turquia invadia a Síria para impedir que forças curdas apoiadas pelos americanos consolidassem seu território. O povo americano estava focado no resultado das eleições de 2016; no entanto, o povo sírio concentrava-se em fugir, com cerca de 11 milhões de pessoas — a metade da população da Síria antes da guerra — movimentando-se para países vizinhos ou dentro de seu país. A queda de Aleppo veio no fim de dezembro, levando milhares de oposicionistas até a província de Idlib, onde muitos comentaristas pró-Assad alegavam que os rebeldes seriam encurralados e massacrados.

Enquanto o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, tomava as rédeas de Washington, o regime de Assad desviava a atenção para Idlib e áreas no sudoeste da Síria, adjacentes a Israel e Jordânia, que estavam sendo controladas pelos rebeldes. Vendo com mais atenção, entretanto, percebeu-se que essa força era, mais do que nunca, composta por grupos apoiados por iranianos e integrantes do Hezbollah. Rebeldes financiados pelos americanos lutaram contra eles, fazendo o regime recuar apesar do suporte aéreo da Rússia.

Esse era o contexto da guerra quando o governo Trump deparou com seu primeiro ataque com armas químicas na Síria, em abril de 2017, na vila de Khan Shaykhun, em Idlib. As Nações Unidas acabaram confirmando o uso do agente nervoso sarin — uma substância da qual Assad teria, supostamente, se livrado. Dessa vez, em vez de tentar chegar a um acordo, Trump atingiu a base aérea responsável pelo ataque.

Ainda assim, Washington se viu lutando contra um dos inimigos de Assad, o Estado Islâmico. No verão de 2017, os Estados Unidos, a Rússia e a Jordânia assinaram um acordo para diminuir consideravelmente as lutas em partes do país, permitindo que o governo lançasse uma ofensiva contra o grupo jihadista. Com o exército esgotado, eles dependiam, em parte, de contingentes de milícias xiitas e unidades organizadas pelos russos. Eles esperavam que as áreas sunitas liberadas do controle do Estado Islâmico dessem boas-vindas à ofensiva do regime, mas sua brutalidade, junto com xiitas integrantes da força financiada pelo Irã que vinham ocupar áreas sunitas, fez com que a maioria dos deslocados internos fosse em direção a zonas dominadas pelos curdos.

O Estado Islâmico, no entanto, não era a única prioridade do regime, muito menos a mais importante. No começo de 2018, Assad lançou uma ofensiva para tomar o controle de Ghouta — o local dos ataques químicos de 2013, onde havia a última grande presença de oposicionistas perto da capital da Síria. O regime e as milícias financiadas pelo Irã conseguiram dividir esse espaço em dois, enquanto a Rússia tentava evacuar civis e soldados para outras áreas. Quando esses diálogos sucumbiram, o governo sírio ordenou um ataque militar para tomar Ghouta à força. Seja por ter um número limitado de militares, por pura brutalidade ou por ambos, Assad novamente apelou para o uso de armas químicas, matando dezenas de pessoas e ultrapassando, mais uma vez, a linha vermelha de Washington.

E mais ataques americanos foram lançados contra alvos do governo sírio. O secretário de Defesa dos Estados Unidos, James Mattis, caracterizou-os como uma tentativa “única” para impedir o uso de armas químicas, mas não importa o que venha a seguir; essas armas são apenas uma parte terrível na resolução da guerra civil na Síria, que é possivelmente o maior desastre humanitário desde a Segunda Guerra Mundial. O número de mortes chegou a quase meio milhão de pessoas, embora as Nações Unidas tenham parado de contar. Muitas outras estão feridas e desaparecidas. Um relatório do governo americano alegou que o regime de Assad emprega o serviço de um crematório perto da prisão de Saydnaya, nos arredores de Damasco, o que indica que muitos dos restos mortais jamais serão encontrados. O Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados estima que 13,1 milhões de sírios necessitam de assistência humanitária, com mais de 6 milhões de deslocados internos e 5 milhões cadastrados como refugiados. Centenas de milhares ainda permanecem sem nenhum registro. Calcula-se que o total de refugiados sírios no Líbano hoje ultrapasse um quarto da população da Síria; na Jordânia, esse número é apenas um pouco menor.

Por si só, isso já é terrível. Mas o fato é que, para muitos países da região, é inaceitável que os ânimos estejam “se acalmando” na Síria. Israel, preocupado com o aumento de milícias e influência iranianas na Síria, bombardeia o país como nunca. A Turquia, preocupada com o crescimento de forças dominadas pelos curdos e ligadas ao arqui-inimigo de Ancara — o Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) —, invadiu o nordeste da Síria, retirando os curdos de seu reduto em Afrin e ameaçando fazer o mesmo em Manbij. Enquanto isso, negociações em Genebra e em outros lugares ainda não chegaram a um planejamento viável de cessar-fogo ou qualquer acordo político.

Como a guerra civil no Líbano, a guerra civil na Síria agora ameaça se transformar na Guerra da Síria — um conflito regional que provavelmente queimará durante uma geração inteira. E os civis estão amaldiçoados a viver a guerra, e a morrer nela, todos os dias.

Fumaça proveniente de ataques em Yarmuk, um campo de refugiados palestinos nos arredores de Damasco (Foto: MAHER AL MOUNES/AFP GUERRA QUÍMICA)
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Conflito na Síria já evoluiu para uma “miniguerra mundial”

São pelo menos 13 países envolvidos em 7 anos de confrontos

Conflito na SíriaConflito na Síria

Já são mais de sete anos de conflito na Síria, com um saldo superior a 400 mil mortos, segundo a ONU. Desde que teve início, o embate de forças já foi chamado de “primavera árabe”, “guerra civil”, “guerra contra o Estado Islâmico” e agora especialistas apontam que se trata de uma “miniguerra mundial”.

O fato é que 19 países participaram direta ou indiretamente nas batalhas que ainda causam muita confusão no Ocidente sobre quais as reais motivações e consequências, quando ela chegar ao fim.

No início, dizia-se que era um conflito interno, opondo as forças do presidente Bashar al-Assad, considerado um ditador por parte de seu povo, e as forças “rebeldes”, que visavam uma mudança no país marcado por grandes índices de desemprego e grande pobreza.

Desde seus primórdios, em 2011, 13 lançaram ataques diretos, enquanto outros seis ofereceram apoio bélico.

Entendo quem são eles e como é sua atuação:

Rússia

Desde os tempos da União Soviética Moscou apoia a Síria, tendo interesse na saída para o mar do país, que poderia facilitar o escoamento da produção de petróleo.

Sabe-se que o governo de Vladimir Putin é o principal apoio do governo sírio, enviando armas e soldados para lá. O argumento sempre foi que combatiam as forças rebeldes, sobretudo as do Estado Islâmico, que dominava mais de um terço do território sírio até o ano passado.

Desde setembro de 2015 a Rússia aumentou sua participação no conflito, fazendo seguidos ataques aéreos e bombardeios, o que deu sobrevida a Assad.

O problema é que, segundo uma comissão de inquérito da ONU, em meios aos ataques russos, morreu um grande número de civis.

Estados Unidos

Sob o governo do ex-presidente Barack Obama, os Estados Unidos faziam um discurso aberto sobre derrubar Assad e ajudar grupos islâmicos que chamava de “moderados”. Após o ataque químico de 2013, Washington prometeu um bombardeio em retaliação, mas nada fez.

Estima-se que, desde 2014, os EUA lideraram uma coalizão de países ocidentais e aliados regionais, em mais de 11 mil ataques aéreos em solo sírio.

Quando assumiu o poder, em 2017, o presidente Donald Trump afirmou que iria rever a participação dos americanos na guerra. No início deste mês chegou a prometer a retirada de suas tropas, por entender que o papel dos EUA estava “cumprido” após o fim do domínio do Estado Islâmico.

O ataque em conjunto com o Reino Unido e a França na semana passada mostram que a situação não tem prazo para mudar.

Reino Unido

Parte da coalizão de países que se opõe a Assad, desde 2015, os aviões de guerra britânicos concentravam seus bombardeios às posições do Estado Islâmico, incluindo os poços de petróleo sob o controle do grupo extremista.

Desde que surgiram novas acusações de ataque com armas químicas, o gabinete de Theresa May avisou que esse tipo de situação “não poderia ficar impune”.

França

A França tem ligações históricas com a Síria e um interesse no resultado da guerra civil desde seu início, sempre se opondo à continuidade do presidente Bashar al-Assad no poder.

Desde 2013 os franceses vêm dando armas e apoiando militarmente os rebeldes. Logo que assumiu o poder, o presidente Emmanuel Macron vem defendendo repetidamente uma intervenção para derrubar Assad definitivamente.

Canadá

Nos primeiros anos do conflito, o Canadá fez parte da coalizão liderada pelos EUA que enfrentou o Estado Islâmico no Iraque e também na Síria. Quando primeiro-ministro Justin Trudeau assumiu, em 2016, retirou seus soldados do terreno, mas continuou apoiando publicamente a coalizão.

Austrália

Assim como o Canadá, a Austrália fez parte da coalizão que bombardeou o Estado Islâmico no Iraque e na Síria.

Quando um desses ataques resultou na morte de quase 90 soldados sírios, confundidos com as milícias do EI, o primeiro-ministro australiano, Malcolm Turnbull, pediu desculpas pelo erro.

Holanda

Entre 2014, a Holanda aceitou participar da campanha militar contra o Estado Islâmico. O país realizou centenas de ataques aéreos com aviões F-16 contra as bases do EI. Desde 2016 decidiu intensificar sua participação, enviando mais soldados para a Síria.

Irã

O Irã é a maior nação xiita do mundo e tem interesse estratégico na Síria. Seu temor era que o país caísse sob o domínio da Arábia Saudita, que é sunita, que está aliada com os Estados Unidos.

Sua contribuição tem sido fundamental para o governo de Assad, com Teerã enviando tropas em solo e investindo bilhões em assistência técnica e financeira. Além disso, subsidia a participação do Hezbollah, grupo extremista libanês, no conflito.

Existem várias bases militares iranianas na Síria, que Israel vem denunciando como parte de um plano de dominação territorial.

Turquia

Não se sabe ao certo de que lado a Turquia está. O governo de Ancara sempre manteve o discurso de apoio à coalizão liderada pelos Estados Unidos, mas há registros de negociações para compra de petróleo quando o Estado Islâmico tinha dezenas de poços sob seu controle.

Desde o final do ano passado, o presidente Erdogan tem concentrado sua intervenção no norte da Síria, onde luta contra os curdos, a quem chama de “terroristas”.

Arábia Saudita

Os sauditas já enviaram, desde 2011, uma grande quantidade de armas para grupos rebeldes na Síria, fornecendo-lhes também inteligência e apoio estratégicos.

Participaram de vários ataques aéreos em estreita colaboração com os EUA. Também lutam veementemente para impedir o aumento da influência do Irã na região.

Israel

Ao longo desta guerra, aviões de guerra israelenses entraram no território sírio para bombardear alvos estratégicos que considera um perigo para sua segurança.

Embora tecnicamente neutro, Israel protege sua fronteira norte, opondo-se à influência do Irã e do Hezbollah, seus inimigos declarados.

Recentemente, Israel lançou um ataque aéreo “em grande escala” contra 12 alvos militares, onde afirma que destruiu metade das defesas aéreas sírias.

Bahrein e Jordânia

Bahrein e Jordânia são outros países do Oriente Médio que já realizaram ataques na Síria.

A Jordânia participou da coalizão liderada pelos EUA quando o EI ameaçou abertamente derrubar o rei Abdullah. Além de disparar foguetes contra o território jordaniano, os jihadistas conseguiram derrubar um avião militar, em 2014. O minúsculo Bahrein juntou-se aos ataques contra o EI na Síria em 2015.

Há registros de outras nações envolvidos de forma menos direta no conflito. A Alemanha enviou 1,2 mil soldados para a Síria, seu maior contingente militar em todo o mundo.

A Noruega participa oficialmente da coalizão liderada pelos EUA, apoiando os rebeldes que se antagonizam a Assad. A Líbia, após a queda de Muammar al-Gaddafi, enviou tropas e armas em apoio às forças rebeldes por um curto período de tempo.

A situação do Iraque era muito semelhante à da Síria quando tinha parte de seu território dominado pelo Estado Islâmico. Recentemente, abriu seu espaço aéreo para a passagem de aviões iranianos em apoio a Assad. Com informações BBC e Washington Post