Religioso que atacou negros e gays é indicado oficialmente para presidir colegiado na Câmara
05 de março de 2013 | 18h 10
BRASÍLIA – A maioria da bancada do PSC decidiu nesta terça-feira, 5, indicar o deputado e pastor Marco Feliciano (SP) para presidir a Comissão de Direitos Humanos da Câmara. Pela tradição da Casa, o ato o coloca, na prática, na chefia do órgão parlamentar. Partidos governistas e da oposição, porém, não descartam rejeitá-lo em votação prevista para hoje. Feliciano é acusado de ser racista e homofóbico por causa de declarações recentes feitas na internet.
O PT, que tradicionalmente comanda esse colegiado, abriu mão da vaga em favor da sigla cristã, que faz parte da base de sustentação do governo da presidente Dilma Rousseff. O papel da comissão é analisar projetos que tratem de interesses de minorias.
Feliciano escreveu em sua página no Twitter, em 2011, que o amor entre pessoas do mesmo sexo leva "ao ódio, ao crime e à rejeição", e que descendentes de africanos são "amaldiçoados". Ontem, ele defendeu as frases. "Não neguei o que escrevi e não nego agora. Foi só um post. A maioria das informações sobre mim não são reais", afirmou.
A bancada do PSC decidiu manter a indicação de Feliciano para a Comissão de Direitos Humanos depois de quase três horas de reunião. Dos 17 deputados do partido, 13 teriam votado a favor do nome do pastor.
Preocupado com a repercussão negativa do nome de Feliciano, o presidente da Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), fez um apelo nos bastidores para a bancada desistir da nomeação. Mas não adiantou.
A previsão é que a eleição hoje de Feliciano para a presidência da Comissão seja tumultuada. "Vamos fazer uma guerra. Do ponto de vista prático, essa indicação significa a inviabilidade da comissão, que passará a ser um palco de conflito permanente", afirmou o líder do PSOL, deputado Chico Alencar (RJ). "A indicação vai criar uma crise sem precedentes. Mesmo que venha a ser eleito, ele vai ter muito votos contrários. Não é uma restrição ao PSC e sim ao papel dele. É uma desmoralização para o Parlamento", disse a deputada Érica Kokay (PT-DF).
Ao ter seu nome ratificado pelo líder do partido, deputado André Moura (SE), Feliciano defendeu a discussão prioritária dos seguintes temas: imigração ilegal, terras para quilombolas e para índios. "Muitas minorias têm sido esquecidas pela comissão", disse. Feliciano tem sido um crítico do espaço dado à defesa de direitos de gays, lésbicas, bissexuais e transexuais pela comissão. "Há um predomínio dos assuntos GLBT. Precisamos discutir outros assuntos", afirmou.
"O casamento de pessoas do mesmo sexo não é previsto na Constituição. O casamento civil neste país é entre homem e mulher. E ponto final", disse Feliciano, assim que sua indicação foi anunciada. Em entrevista, Feliciano aproveitou para se comparar ao pastor norte-americano e defensor dos direitos humanos Martin Luther King. "Disseram ser da idade da pedra ou dos tempos de caça às bruxas a escolha de um pastor para presidir a Comissão de Direitos Humanos. Lembro que o maior defensor dos direitos humanos de todos os tempos foi um pastor: Martin Luther King. Não me comparo a ele, mas era também um cristão."
No primeiro mandato como deputado federal, Feliciano apresentou alguns projetos de lei, como o que institui o programa "Papai do Céu na Escola" na rede pública de ensino. Outra proposta do deputado pretende sustar a decisão do Supremo Tribunal Federal que reconheceu como entidade familiar a união entre pessoas do mesmo sexo. Feliciano apresentou ainda projeto de lei para punir quem sacrifica animais em rituais religiosos, prática adotada em algumas cerimônias do candomblé. "Mesmo meu partido sendo conservador e de direita, ninguém será tolhido na comissão", afirmou.
Lobo. Para o presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), Carlos Magno, a indicação do pastor para a presidência do colegiado é "um retrocesso para o País". Assumindo o cargo, afirmou Magno, Feliciano tomaria as rédeas de uma comissão tida como estratégica para os gays. "Acho que a nomeação dele à presidência é um retrocesso para o País. Ele é um pastor homofóbico", disse Magno. "Não vamos aceitar. A comissão é estratégica."
O ex-presidente da associação, Toni Reis, comparou: "é como colocar lobos para cuidar das ovelhas". A ABGLT anunciou que já articula medidas de protesto à nomeação. Uma delas será mobilizar parlamentares de partidos aliados da associação para esvaziarem as reuniões do colegiado.